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As criptomoedas seguem criando polêmicas e levantando discussões no mundo jurídico. A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) já se posicionou, num passado recente, quanto à proibição da aquisição direta de criptomoedas por fundos de investimento regulados, sob o pretexto de incerteza quanto à natureza jurídica que permeia a própria essência deste tipo de “moeda”. A discussão que se propõe agora diz respeito à utilização das moedas digitais em operações de aquisição e/ou alienação de participação societária detida em sociedades brasileiras.

Nesse sentido, a atual conjuntura legislativa e jurisprudencial brasileira impede que as criptomoedas sejam qualificadas como “moedas” propriamente ditas, por não gozarem de duas características essenciais para tanto: (i) o curso legal, que definem moedas como meio exclusivo de pagamento; e, (ii) o curso forçado, quando constatada a impossibilidade de conversão do valor monetário em outro valor, de outra espécie.

Ainda contribuindo para o grau de indefinição da natureza jurídica das criptomoedas, a CVM, em nota veiculada em outubro de 2017, entendeu que, em alguns casos muito específicos, quando presentes os requisitos indicados na legislação aplicável[1], as criptomoedas estariam abrangidas pelo conceito de valor mobiliário e, consequentemente, sujeitas ao regime legal específico existente.

Entretanto, considerando o grau de especificidade da aplicação da legislação mobiliária conforme vista acima, para as demais aplicações das criptomoedas, mais correntes no cotidiano, especialmente quanto à sua negociação, conclui-se que deverão ser tratadas como bens incorpóreos, já que não gozam de existência material, tangível, mas possuem valor eminentemente econômico, reconhecido pelo mercado.

Neste sentido, se consideradas como bem intangível, as criptomoedas serão, também, permutáveis, nos termos do artigo 533 do Código Civil Brasileiro. Desta forma, vislumbra-se, do ponto de vista societário e contratual, a possibilidade do sócio ou acionista permutar sua participação societária em moedas digitais. Nenhum impedimento se vislumbra, ainda, no disposto na legislação societária específica[2], quanto à integralização do capital social de sociedades com o uso de criptomoedas.

Referidos dispositivos legais determinam que o capital social da sociedade seja expresso em moeda corrente nacional, não havendo vedação para integralização deste capital com bens, desde que possam ter seu valor atribuído em moeda corrente.

Ora, atualmente já se constata a integralização do capital social de sociedades brasileiras mediante capitalização de bens imateriais como marcas, patentes, softwares, dentre outros bens intangíveis, logo, não existiria impedimento, a priori, para fazê-lo por meio de criptomoedas.

Conclui-se, preliminarmente, que não obstante o impasse existente quanto à definição da natureza jurídica das criptomoedas, viável a utilização e operacionalização das moedas digitais em operações de alienação de participações societárias de sociedades brasileiras, bem como também possível à integralização de capital com aporte de criptomoedas, desde que respeitadas, em qualquer hipótese, os ditames da legislação societária aplicável.

[1] Artigo 2º, IX da Lei nº 6.385 de 7 de dezembro de 1976 – dispõe sobre o mercado de valores mobiliários e cria a Comissão de Valores Mobiliários. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6385compilada.htm> Acesso em: 25.05.2018.

[2] Artigo 7º da Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976 – dispõe sobre as Sociedades por Ações. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404compilada.htm> Acesso em: 25.05.2018; e Artigo 997, III do Código Civil Brasileiro – Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002 – Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 25.05.2018.

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